O BÊBADO E O EQUILIBRISTA

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Há muitos anos, quando eu estava construindo a minha casa, aprendi com o engenheiro um princípio da construção civil que nunca mais me esqueci: a “laje em balanço”, ou seja, que determinados lajes de concreto, para que parem em pé e não trinquem toda a casa com o passar dos anos, precisam estar balanceadas em cima de uma ou mais vigas, ou seja, o cálculo deve ser feito de tal maneira que o peso daquela laje, platibanda ou beiral deve ficar metade de um lado, metade do outro lado de uma viga, para que haja um “balanço” natural, com pesos iguais para os dois lados, com este “equilíbrio” a casa fica firme para toda vida.

Em nossa vida não é diferente. Quando levamos um estilo de vida desequilibrado, assim como numa construção, estamos sem perceber colocando mais pesos em algumas áreas, fazendo com que, como passar do tempo, apareçam trincas e rachaduras na nossa alma e relacionamentos. O equilíbrio é uma virtude que deve ser perseguida. As culturas mais antigas, como as do extremo oriente, sempre valorizaram a busca pelo equilíbrio até por meio de suas lutas marciais. Uma destas lutas, o judô, tem por principal objetivo fortalecer o físico, a mente e o espírito de forma equilibrada, além de desenvolver técnicas de defesa pessoal.

Levar uma vida em desequilíbrio não faz bem a ninguém, tanto que quem não tem equilíbrio em suas relações pessoais, emoções ou trabalho, são chamadas pejorativamente de “pessoas desequilibradas”… Daí a pergunta que devemos fazer a nós mesmos: temos prestado atenção e reservado tempo para as muitas áreas de nossa vida, ou estamos vivendo em desequilíbrio, olhando mais para uma área da vida e, como uma laje que não está em balanço, forçando a estrutura da nossa casa existencial. As circunstâncias da vida sempre tentarão arrancar nosso equilíbrio, mas jamais perca o seu equilíbrio por mais forte que seja o vento da tempestade. Temos que racionalizar nossa agenda e remir o tempo, reservando em nosso cotidiano momentos com a família, momentos com os amigos, momentos para leitura, momentos para oração e reflexão na vida, momentos para entretenimento (cinema, teatro, televisão…), tudo isso é importante. Reservar tempo para o trabalho? Bem, este arranja o tempo dele sozinho em nossa vida, sem a gente precisar forçar. Na verdade, o grande esforço eterno é não permitir que o tempo do trabalho não sucumba toda a sua existência. Alguém já disse que nunca viu ninguém no leito de morte reclamar assim: “Poxa, eu deveria ter dado mais tempo para o trabalho, gastei muito pouco tempo no escritório, como me arrependo de não ter olhado mais pelo meu chefe…”. Ao contrário, é comum ver pessoas bem vivas, mas já bem vividas, pensando em voz alta:
“_poxa, não vi meus filhos crescerem…” ou
“_poxa, perdi os meus amigos na esquina entre o trabalho e a casa…”
De fato, você não é mais importante para seu chefe do que para seu cônjuge, amigos ou filhos. Sim, temos que olhar para nossas relações pessoais e familiares, não obstante, temos que também olhar para nós mesmos.

Muitos dizem que, por estas e outras, viver é uma arte, contudo, Cesare Pavese foi pontual ao afirmar que “toda a arte é um problema de equilíbrio entre dois opostos”. Quem consegue equilibrar entre os extremos que a vida impõe, são os verdadeiros artistas existenciais. Viver é andar entre o céu e o inferno sem perder o equilíbrio.

Eu já disse neste link ( http://www.cafecomdeus.com.br/felicidade/ ) que o objetivo de todo homem é alcançar a felicidade. A poetisa Carlota Vimeiro diz que “felicidade é o equilíbrio entre a vergonha e o orgulho…”. Sim, uma das matérias-primas para a construção da felicidade é o equilíbrio.

Viver uma vida dedicada somente a sua religião, nunca perdendo cultos, missas e reuniões? Errado!
Viver uma vida dedicada somente a família, subtraindo todo o tempo para o convívio com os amigos e vizinhos? Errado
Morar dentro da empresa? Passar o dia na internet (redes sociais, jogos, pornografia)? Querer estar apenas com o cônjuge (noivo/a, ou namorado/a) alienando-se socialmente? Não prestar atenção nas opiniões alheias? Achar que apenas uma pessoa (você mesmo) está certa nos pontos de vista?
Tudo isto promove uma existência estática, de uma nota só, gerando o desequilíbrio que levará mais tarde à queda existencial ou emocional. Movimente-se entre as muitas áreas da sua vida, não estacionando num ponto apenas. Albert Einstein foi perfeito ao fazer esta comparação: “Viver é como andar de bicicleta: É preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio.”

Todo desequilíbrio é pecado. No trato com as finanças, quem gasta demais, comete o pecado de ser perdulário, já quem guarda demais, comete o pecado de ser um avarento. Entre ser o bêbado (embriagado com seus extremos) ou ser o equilibrista (sóbrio em sua prudência), opte por não cair pelas valas da vida.

Existem momentos em que a vida exige uma perda momentânea do equilíbrio, como resultado de algumas ações de ousadia. Devemos entender que ter momentos de desequilíbrio, também faz parte do aprender a equilibrar-se. Não há equilibrista que jamais tenha caído da corda. Os desequilíbrios nos apontam para as vantagens do equilíbrio, contudo, estes desequilíbrios importantes devem ser encarados como acidentes existenciais de percurso, não como um estilo de vida a ser adotado. Kierkegaard disse que “ousar é perder o equilíbrio momentaneamente. Não ousar é perder-se”.

O filósofo dos filósofos, Rei Salomão, nos deixa uma importante lição sobre vida equilibrada por meio deste lindo poema:

“Tudo neste mundo tem o seu tempo; cada coisa tem a sua ocasião.
Há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar;
tempo de matar e tempo de curar; tempo de derrubar e tempo de construir.
Há tempo de ficar triste e tempo de se alegrar; tempo de chorar e tempo de dançar;
tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las; tempo de abraçar e tempo de afastar.
Há tempo de procurar e tempo de perder; tempo de economizar e tempo de desperdiçar;
tempo de rasgar e tempo de remendar; tempo de ficar calado e tempo de falar.
Há tempo de amar e tempo de odiar; tempo de guerra e tempo de paz.”
Eclesiastes 3:1-8

Nestes tempos de extremos, persiga uma vida de equilíbrios.

Luciano Maia

 

 

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