Nóia ou Metanoia? (parte 1)

Por Stevan Maia de Camargo Corrêa

Quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia. – Provérbios 28:13

 

Essa semana me lembrei de quando era adolescente e um amigo, olhando para o baseado que tinha em sua mão, me disse com aquela voz apertada de quem acabou de dar uma bola: “drogas é bom, porque se não fosse, ninguém usava”. Mesmo sendo usuário de drogas naquela época, eu já compreendia que essa fala levava em conta apenas os efeitos imediatos, lisérgico e até mesmo lúdicos, daquilo que nós consumíamos, mas não considerava as consequências a médio e longo prazo, tanto para nossa saúde física e psicológica, quanto para nossa saúde social e espiritual.

 

Todas as drogas tem algo em comum, não importa se lícitas ou ilícitas: seja álcool, cannabis ou chocolate; seja cocaína, LSD ou fast-food; seja uma superdosagem de Benflogin, Lexotan ou pornografia: todas essas coisas tem potencial para nos escravizar.

 

Foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçam firmes e não se deixem submeter novamente a um jugo de escravidão. – Gálatas 5:1

 

E para não se tornar vítima de nenhuma delas é importante que conheçamos a nós mesmos e ao nosso inimigo – já diria Sun Tzu (autor de “A Arte da Guerra”). Em outras palavras, é preciso conhecer como funciona a nossa mente e como aquilo que consumimos atua sobre ela.

 

Nosso cérebro pode ser dividido entre a mente racional, com sede no neocórtex e as mentes emocional e instintiva, chamados sistema límbico e reptiliano.

 

É uma falácia dizer que animais não são racionais, pois outros mamíferos também possuem neocórtex, mas nenhum tão desenvolvido como o do ser humano. Eu gosto de pensar no neocórtex como a sede do espírito, o que nos faz imagem e semelhança de Deus, pois é esta área do cérebro que realmente nos diferencia dos outros animais. Já o sistema límbico é o que a Bíblia chama de carne.

 

Vigiem e orem para que não caiam em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca. – Mateus 26:41

 

Enquanto o neocórtex é a sede do raciocínio, da consciência e da linguagem, nos fazendo humanos; o sistema límbico é sede das emoções e é o que nos faz animais. Este sistema está ligado à sobrevivência do indivíduo e da espécie: sua função é evitar a dor e buscar o prazer. Abastecido pelos instintos do cérebro primitivo, ele funciona por ação e recompensa, tendo como moeda um neurotransmissor chamado dopamina.

 

A dopamina é a molécula do vício. Quando nós usamos maconha, por exemplo, é o THC que gera as sensações que curtimos, mas é a descarga de dopamina que nos faz querer sentir essas sensações novamente. Contudo, os níveis de dopamina são gerados pela expectativa e não pela atividade em si. Assim, estar viciado significa querer cada vez mais, mas gostar cada vez menos. O usuário de drogas vai ficando “cabeção” e cada vez mais precisa de uma quantidade maior da droga para atingir a sensação desejada. Dizer que maconha não vicia é uma armadilha. Pode ser que eu não me vicie, mas isso não significa que outra pessoa não possa se viciar, pois o vício em cada droga depende de uma predisposição genética que algumas pessoas possuem e outras não. É por isso que hoje em dia, mais frequentes e até mais perigosas do que as drogas “tradicionais”, são o vício da compulsão alimentar e da pornografia, pois comida e sexo são coisas que, em nossos sistemas límbicos, todos nós fomos programados para buscar, pois essas são coisas diretamente ligadas ao instinto de sobrevivência do indivíduo e da espécie.

 

“Tudo me é permitido”, mas nem tudo convém. “Tudo me é permitido”, mas eu não deixarei que nada me domine. – 1 Coríntios 6:12

 

A obesidade é um mal moderno. Nossa mente nos faz desejar mais um hambúrguer suculento do que uma folha de alface porque comidas mais calóricas causam uma maior descarga de dopamina em nosso cérebro. É a dopamina que cria aquele “segundo estômago” para sobremesa. Na antiguidade, esse mecanismo era essencial para sobrevivência, pois o alimento era escasso e pouco calórico, hoje é apenas mais uma fonte de doenças cardiovasculares, diabetes, câncer… ou seja, mais um vício que devemos combater.

 

Jesus respondeu: “Digo a vocês a verdade: Todo aquele que vive pecando é escravo do pecado. – João 8:34

 

Hoje eu li que “abandonar o vício em pornografia é como tentar deixar de fumar, mas sempre ter um maço de cigarros no bolso”. Se você observar as estatísticas, o advento dos smartphones impulsionou a indústria pornográfica como nunca antes na história e criou uma legião de viciados. Pessoas sem nenhuma propensão para qualquer outro vício, se viciam em pornografia. Mas você se lembra que estar viciado significa querer cada vez mais, mas gostar cada vez menos? Pois é. O vício em pornografia pode gerar uma série de consequência como disfunções, perversões e frustrações sexuais. O orgasmo é o maior ativador de dopamina que existe, fazendo do desejo reprodutivo a maior força motivacional da natureza. Não é à toa que a Bíblia fala tanto da importância do domínio próprio frente aos desejos sexuais.

 

Por isso digo: vivam pelo Espírito, e de modo nenhum satisfarão os desejos da carne. – Gálatas 5:16

 

Um experimento realizado com ratos mostrou que as cobaias preferiam dopamina à comida até o ponto em que literalmente morriam de fome. E apesar de tudo isso, a dopamina em níveis normais é importante para as nossas vidas. Os problemas acontecem quando há um desequilíbrio deste neurotransmissor, causando vício e desencadeando doenças como ansiedade e depressão. Assim, se você não se deixar dominar, nem se embriagar, o vinho não lhe fará mal (Provérbios 20:1, Efésios 5:18, 1 Timóteo 5:23).

 

Para encerrar, gostaria de propor uma meditação para cada um de nós. Pense em uma coisa que você gosta muito: pode ser uma droga, uma comida, sexo, exercícios físicos, um jogo eletrônico… Pense nisso e, em seu íntimo, responda “sim” ou “não” às perguntas abaixo:

 

  1. Esse hábito aumentou (em quantidade, tempo ou intensidade) desde que você o iniciou?
  2. É algo que você sente falta se ficar muito tempo sem?
  3. A falta ou excesso disso afetam seu humor?
  4. Você sente dificuldade de controlar esse hábito?
  5. Você deixa de fazer ou adia outras atividades por causa deste hábito?
  6. Você já tentou deixar esse hábito, mas não conseguiu?
  7. Você gasta uma quantidade significativa de tempo ou energia para planejar, obter, utilizar, esconder ou se recuperar após o uso?

 

Se você respondeu “sim” para 3 ou mais dessas perguntas, segundo a Sociedade Americana de Psiquiatria, você tem um vício. E se você quer se libertar de um vício de verdade, isso só é possível a partir do sincero arrependimento, chamado de metanoia.

 

Irmãos, vocês foram chamados para a liberdade. Mas não usem a liberdade para dar ocasião à vontade da carne; pelo contrário, sirvam uns aos outros mediante o amor. Toda a lei se resume num só mandamento: “Ame o seu próximo como a si mesmo”. – Gálatas 5:13-14

 

Stevan Maia de Camargo Corrêa