Qual a última vez que você abraçou seu filho sonâmbulo, quando ele ainda insistia a achegar-se nas madrugadas, interrompendo seu leito conjugal?
Qual a última vez que você viu aquela sua grande amiga do ensino médio, cujos pais mudaram de cidade e hoje você não mais a encontra nas redes sociais?
Qual foi a última vez que você conversou com aquele seu amigo, que foi transferido para outro estado, e o tempo encarregou-se de afastar vocês?
Qual a última vez que você saiu com seus amigos de juventude e chegou tarde da madrugada, feliz, porém sob os protestos de seus pais?
Qual foi a última vez que seu filho se sentou em seu colo? Ou melhor, você se lembra qual foi a última vez que você se sentou no colo de sua mãe? Se lá atrás eu soubesse que aquela seria a última vez, o colinho derradeiro, certamente que eu teria aproveitado aquele colo quente muito mais.
Qual foi a última vez que você andou de bicicleta com a turma de juventude lá do seu bairro? E aquele primo, que foi seu cúmplice nalgumas aventuras confidenciais? Hoje ele parece mais um estranho…
Mesmo sabendo que nada se repete do mesmo jeito e que, portanto, temos que aproveitar cada dia como se fosse único, além disto, cada dia é também a última vez de alguma coisa. O que torna os dias e os pequenos rituais cotidianos ainda mais sagrados.
Quando chegou a hora, Jesus sentou-se à mesa com os apóstolos e disse para eles: “Como tenho ardentemente desejado comer esta Ceia da Páscoa com vocês, antes do meu sofrimento! Pois eu digo a vocês que nunca comerei esta Ceia de novo, até que eu coma o verdadeiro jantar que haverá no Reino de Deus”. Então Jesus pegou o cálice de vinho e deu graças.
Jesus tinha a clara noção da “última vez”, e queria aproveitá-la muito bem. Jesus queria curtir cada segundo com seus amigos discípulos. Ele desejava estar em volta da mesa com eles e sabia que seria a derradeira Ceia. Certamente que ele soube aproveitar cada momento, cada último olhar, cada gole de vinho, sentindo-o bem em suas papilas gustativas. Cheirou o pão, sentiu o aroma do trigo, como se fosse a última vez, pois sabia: seria mesmo a última refeição de sua vida.
Tenho feito este exercício com muita frequência já há alguns meses. Ponho o garfo na boca e sinto, detalhadamente, o sabor, os aromas e a deglutição. Sento à mesa e observo, cada detalhe e cada movimento, pois podem ser derradeiros. Nos últimos meses, quando abraço alguém e digo “até logo!”, tenho abraçado com gosto, com vontade mesmo, e cuido em olhar nos olhos, sentir o cheiro, dar e receber carinho sem medida, pois, pode ser a última vez…
Um pode adoecer, outro pode mudar, outro pode aborrecer-se e brigar, outro ainda pode falecer… Não sabemos de nada. Resta-nos aproveitar cada olhar e cada abraço, como se derradeiro fosse.
Qual foi sua última vez?