CENA 1:
Era dia dos pais e a típica homenagem estava sendo realizada. Cada filho dando de presente para seu pai uma almofada estampada ou com as marcas das mãozinhas, se não-alfabetizado, ou com uma frase de carinho, se já alfabetizado. Apesar de aquele ser um garoto muito dócil e educado, era visível a inquietação daquele menino sem pai. Ao contrário dos demais, ele não tinha a quem presentear sua almofada. Ficou exitoso entre entregar para a mãe ou a avó… Sob o pretexto da dúvida, num processo de catarse emocional, atirou-a vigorosamente, como um projétil, em direção a elas. Qualquer pessoa menos atenta podia perceber a raiva que invadia seu coração… Ele não podia entregar seu presente para seu pai, um amigo para o fim do mundo.
CENA 2:
Dentro da discoteca de CDs importados e raridades a conversa despretensiosa com a atendente deságua, sem qualquer razão aparente, no tema: perdas nos relacionamentos familiares. A moça abre o coração ao cliente novato e confessa, em dez minutos, que a ausência da figura paterna em sua formação significou uma marca emocional que dificulta seu relacionamento com a vida e consigo mesma. Diz crer que as mulheres que tiveram uma presença masculina no transcorrer da vida, são mais seguras.
CENA 3:
As estórias dos protagonistas, interpretados por Steve Carell e Keira Knightley se cruzam quando faltam poucos dias para um meteoro chocar-se com a terra e o mundo acabar. Várias pessoas aproveitam seus últimos dias de vida para fazerem todos os tipos de transgressões que jamais fizeram. Contudo, estes dois personagens buscam o sentido final de suas vidas tentando resgatar seus relacionamentos familiares deixados para trás. A vida passa a fazer sentido se os desencontros converterem-se em rendição afetiva. Steve Carell perdoa seu pai, recuperando seu sorriso e, já com o coração limpo da mágoa, encontra um novo amor para passar o fim do mundo em paz.
CENA 4:
Para fugir dos traumas do passado, o caminhoneiro João resolve deixar sua cidade natal para trás e cruzar o país. Ele dirige Brasil afora, sempre solitário, até que numa de suas viagens descobre que o menino Duda se escondeu em seu caminhão. Duda é órfão de mãe e está à procura do pai, que fugiu para São Paulo antes mesmo dele nascer. A contragosto, João aceita levá-lo até a cidade mais próxima. Entretanto, durante a viagem nascem elos entre os dois, que faz com que João tenha coragem para enfrentar seu passado. A paternidade perdida e a resgatada e suas duras conseqüências são o foco do filme “À Beira do Caminho”, de Breno Silveira. Trilha sonora toda de Roberto Carlos.
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Além destas quatro cenas, uma quinta, que não será relatada, povoaram meus últimos sete dias.
Uma série de doenças de alma, traumas, angústias, inseguranças, raivas e relacionamentos mal resolvidos com Deus são conseqüências de ausências ou relações mal resolvidas com progenitores, especialmente com a figura paterna. Quanto lixo emocional é depositado na alma da pessoa que experimentou a ausência paterna. Por vezes o mal cheiro desta latrina passional contamina os relacionamentos futuros, impedindo que a vida da pessoa exale o cheiro das flores.
Traumas advindos de separações mal feitas ou matrimônios preservados à base de formol (com aparência externa, mas sem vida interna, expostos em prateleiras sociais dentro de vidros estéreis).
Nosso desafio, como indivíduos, é não repetir a estória de terror em nossa família. Não reviver na vida dos nossos filhos o enredo da desgraça emocional fruto de nossos relacionamentos conjugais conturbados ou inexistentes.
Vidas saudáveis são construídas com relacionamentos e famílias saudáveis. Nossa escolha tem de ser pelo amor à próxima geração, nossos filhos, não entregando ao mundo novos órfãos emocionais, que, doentes da alma, serão infelizes, cheios de culpa e julgadores da sociedade e de Deus pela equivocada escolha de seu pai ou mãe.
O maior legado que alguém pode deixar para a sociedade ou para seus filhos é esforçar-se ardentemente por preservar um relacionamento conjugal equilibrado, que refletirá diretamente na saúde psicoemocional da prole.
O melhor amigo para o fim do mundo é o pai.
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Da trilha sonora do filme “Procura-se um amigo para o fim do mundo”